O que teria a ver a final do Clausura 2011 de Honduras,
entre Olimpia e Motagua, com o golpe de estado de 2009? Ambos os clubes, que
fazem o clássico da capital Tegucigalpa, tem como donos famílias chave dentro
da oligarquia hondureña, e que foram mentoras da tragicomédia que fez com que
os militares levassem o ex-presidente Zelaya de pijamas para a base militar
americana de Palmerola e daí pro exílio.
O Motagua, conhecido também como los aguilas, é
mais um ramo de investimento do clã Atala, dono do banco Ficohsa, cuja
principal atividade é controlar as remessas de dinheiro vindas dos hondureños
operários na gringolândia. Essas remessas são o principal ingresso do PIB
local. Já o Olímpia, ou los leones, são presididos pelo cidadão Kane
hondurenho, Rafael Ferrari, que controla três dos seis canais da TV aberta,
fora uma rede enorme de rádios que cobre todo o país.
Mas e o golpe? Honduras, país acostumado ao capitalismo
no seu estado mais bruto, vivia um governo progressista, dirigido por um
latifundiário. Em sua política internacional, mostrava sinais de autonomia,
aderindo a um latino-americanismo nunca antes visto nestas plagas. Essa
insubmissão toma ares de grandeza com a adesão à ALBA, de olho a princípio no
petróleo subvencionado do convênio Petrocaribe. Pânico na oligarquia. Os Atala
são os principais articuladores em Honduras do CAFTA, tratado de abre as pernas
pros EUA, que move muita grana em comércio e telecomunicações. Ferrari assistia
sua corporação Televicentro, construída com tanto labor, perder terreno para
emissoras mais próximas ao governo e a uma maior distribuição de concessões de
rádio.
O golpe em si, foi uma ação orquestrada entre vários
oligarcas, militares e a embaixada americana. Os Atala se juntaram com os
Canahuati e bancaram a campanha de lobby internacional a partir dos EUA.
Ferrari, desesperado com a dívida de mais de 1 milhão de dólares com o Estado
que Zelaya começava a cobrar, intensificou o terror na população, com direito a
um programa de entrevistas com o Estado Maior das forças armadas, com cenário
escuro, pesado, sobre os rumos do país a três dias do golpe. No dia 28 de
junho, dia do golpe, nada foi dito no canal dos Ferrari sobre os “usurpadores
de poder”. Silêncio. Ou melhor, futebol! Momentos gloriosos da seleção de
Honduras foram exibidos nesse domingo inglório, como a vitória épica sobre o
Brasil por 2 a 0 na Copa América de 2001. Com a CNN e outros canais internacionais
cortados.
Bueno, além de donos do Olímpia e Motagua, Atala e
Ferrari mandam na seleção. Banco Ficohsa é o maior patrocinador, e Ferrari é o
diretor de seleções, manda e desmanda nas convocações e en el once. Eis
que o clausura 2011 nos guardou esse clássico, que aqui dizem que é “patrón
contra patrón”, para a grande final. Não costuma ser um jogo de muitas
surpresas. Quando não vale nada quase sempre dá Olímpia, mas nas seis vezes que
disputaram finais, o Motagua faturou cinco. E esse domingo fez-se a regra
olimpista: jugamos como nunca, perdimos como siempre.
Ambas as partidas foram disputas no Estádio Nacional, em
Tegucigalpa, conhecido palco que originou a famosa Guerra do
Futebol, entre Honduras e El Salvador em 1969. No jogo de ida,
segundo a imprensa local, triunfó el futbol… Diferentemente do padrão
local, de muita pegada, chutão e poucos gols, tivemos um jogo aberto em que o
Olímpia buscou mais, mas que terminou num empate em 2×2, com gols de Douglas
Caetano (começou carreira no Zequinha em 2002) e do uruguaio Ramiro la Rata
Bruschi pelo Olímpia; e Amado Guevara, volante e capitão da seleção hondureña,
e Jerry Bengston para los aguilas.
Durante a semana de intervalo entre os dois jogos, os
jogadores do Motagua mandavam recado pela imprensa, afirmando que o Olímpia
tinha perdido muitas chances no jogo anterior, e que o futebol costumava cobrar
essa fatura. Os canais de Ferrari reagiam com várias enquetes que apontavam,
coincidentemente, o favoritismo do Olímpia.
Veio o jogo de volta, bem mais lotado que o anterior. Foi
difícil conseguir ingresso, muita gente ficou de fora, e o exército dispersando
o empurra-empurra a base de gás lacrimogêneo. Dentro do estádio o cidadão não
pode fumar, só a polícia, mas a birita é liberada (?!!). Bola rolando, partida
jogada no melhor estilo hondureño, bruto de início a fim. O Motagua achou um
gol no começo do jogo, depois da espanada do goleiro Noel Valladares pro meio
da área, bem aproveitado pelo oportunista Jerry Bengston. Depois disso, o
Olímpia foi pra cima no abafa, e mesmo sem toque de bola no meio campo acabou
marcando o empate em um escanteio que o zagueiro brazuca Fábio de Souza
cabeceou na gaveta. Fim de primeiro tempo, 1×1.
No primeiro minuto do segundo tempo, uma bola mal
afastada pelo volante Boniek Garcia do Olímpia sobra pra Amado Guevara que
emendou uma bomba, ainda desviada num infeliz defensor, e morreu no barbante.
Daí em diante foi cera e peleia das brabas. Ainda tivemos tempo de ver o
driblador Carlinho, legítimo talento brasileiro com 10 anos de futebol mexicano
na bagagem, tentar dar mais alternativas a meia cancha do Olímpia, sem sucesso.
Nos acréscimos tivemos tempo para mais um gol de Bengston, de pênalti. O
campeão é o Motagua, festa da torcida azul nas ruas e que coroa a ótima semana
dos Atala: expandiram suas fronteiras de ação com nova agência do Ficohsa no
Panamá, abençoados pelos golpistas Micheletti, Pepe Lobo e Martinelli.
Saludos,
Angel Rama
De Tegucigalpa para Impedimento
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